18 de maio de 2009

Encare a direção como uma prática espiritual

Encare a direção como uma prática espiritual
Quem diria: dirigir pode ser uma forma de entrar em contato a unicidade


(14-05-09) – Em recente edição do The Times of India o articulista Stephen Isaac escreveu algumas coisas sobre o ato de guiar, especialmente no trânsito de Bangalore, que talvez possam nos ajudar a dirigir de maneira mais feliz, com mais contentamento e menos angústia. Ele nos convida a pensar na direção como uma prática espiritual. E prova como isso é possível.

Isaac ensina, de início, algo simples, mas que costuma diferenciar os vivos dos mortos. “Sou um motorista com 35 anos de experiência, o que não me habilita a dizer: ‘eu sou perfeito’. Todos os dias eu aprendo alguma coisa nova”.

O recado de Isaac é claro: mesmo nos trajetos conhecidos de todos os dias, é preciso, o quanto antes, percebermos que a vida nunca é banal, que ela nunca se repete e que também nós não somos os mesmos de ontem. Temos sempre muito a aprender sobre nós mesmo e sobre o que nos cerca.

Os sentimentos negativos como raiva, intolerância e agressividade são frutos do ego, lembra Isaac, e não dar importância demais aos nossos desejos mais egoístas já é “um belo exercício espiritual”. Mesmo estando certo, se você deixar seu ego falar mais alto, pode piorar as coisas. Isaac enfatiza com a seguinte citação: “Hoje, vocês são alunos; amanhã, serão professores. Para ser bons professores, vocês precisam continuar sendo bons alunos”. E conclui sobre sua postura na direção: “eu estou sempre analisando a mim mesmo, relembrando onde eu bobeie durante o dia”.

“Dirigir é também uma forma de meditação”, afirma Isaac. Como? Ele explica (e essa é parte mais bonita do seu texto): você deve deixar a sua mente como um papel em branco, exceto para as informações que entram pelos olhos, e se tornar um com o que está ao seu redor: você deve tornar-se o que seus olhos veem.

Por exemplo: quando você olha uma pipa no céu, e se torna um com ela, pode apreciar toda a vista maravilhosa lá embaixo, sentir o céu ao seu redor. Quando você vê uma árvore, ao menos que você se torne a própria árvore, não será capaz de experimentar a sensação dos bichinhos correndo ao longo do seu tronco e folhas; um lagarto fingindo ser você, imitando a cor da casca para se proteger, um pássaro cantando tão próximo como se cochichasse em seu ouvido.

“Tornar-se um com o universo é uma das mais elevadas formas de meditação”, diz o autor. E nos encanta mais um pouco: quando você se torna um com o seu carro, você também está em movimento, é testemunha de cada som que ele emite e é capaz de sentir se ele está feliz ou não. Sua visão periférica é ativada e seus olhos são também todos os espelhos, o retrovisor lhe dá olhos na parte de trás da cabeça. Você sabe se um veículo está perto ou longe, se deve avançar ou dar passagem. Ao mesmo tempo, sua memória conhece cada buraco, cruzamento ou farol.

Mesmo com tudo isso, diz Isaac, ainda somos capazes de conversar com outra pessoa no carro e ouvir uma música ou o noticiário. Às vezes, ele assume, “eu dou uma bobeada, mas, nesses momentos, Deus sempre está comigo. Nunca tive um acidente”.

O que há de mais espiritual nessa meditação, acredita Isaac, é ter certeza de que, ao praticá-la, “eu não estou atrapalhando ninguém, seja um pedestre, um ciclista, uma moto ou qualquer outra coisa, inclusive os animais. Se algum motorista me atrapalhar deliberadamente, eu sorrio e o deixo passar, evitando assim me desconcentrar. Dessa maneira, a minha consciência de ser um com tudo ao meu redor é intensificada pelo cuidado”.

Isaac finaliza de uma forma que nos enche de ânimo: “esta é a meditação da unicidade, do conhecimento de Deus em todos os seres, animados e inanimados. Deus é unicidade, meus amigos, a única maneira de ser. Outro nome para isso é Amor. Conhecê-lo e respeitá-lo é respeitar a vida. Seguir por outra lei é seguir pelo caminho do não-ser, isto é, da Morte”. E nos pergunta: “todos nós podemos chegar a sentir da mesma forma? Eu não sei”.

Eu espero que a gente, ao menos, se permita tentar...



Texto: Mirna Bom Sucesso
14/05/2009
Yahoo! Revista

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