Quando o psiquiatra Sérgio de Paula Ramos, do alto de seus 35 anos de experiência no tratamento dos dependentes de drogas, em entrevista a ZH (terça-feira, 14 de abril), apontou o álcool como porta de entrada para outras drogas, principalmente entre os adolescentes, não disse nenhuma novidade. Mas tocou num ponto que, de certa forma, acaba sempre sendo evitado. Como reprovar uma substância que é anunciada, alto e bom som? Como controlar uma droga que patrocina, inclusive, eventos esportivos?
O crack é devastador, mas o álcool é o craque das drogas. Sucesso em vendas, muitas vezes é o causador de tragédias do nosso cotidiano. Está infiltrado em quase todas as manifestações de “alegria e descontração” do ser humano. É extensa a nomenclatura de bebidas que, anunciadas charmosamente, no fundo não passam de álcool, misturado a outras substâncias, variando apenas seu teor. Como desejar que um adolescente, em plena “festa da vida”, não se drogue com álcool? Difícil, muito difícil.
A dependência ao álcool é fartamente comprovada. Sua aquisição só não causa maiores reações em seus usuários porque a droga é vendida, praticamente sem controle, em qualquer estabelecimento comercial do ramo. Se fosse proibida, como outras drogas, certamente o alcoolista cometeria qualquer desatino para alcançá-la. Vício é assim. Se você tem um fumante ativo em casa (ou no trabalho), sabe do que estou falando. É quase impossível convencê-lo a não fumar após ingerir algum alimento ou diante de um desafio qualquer. Vício é doença. Tem que ser tratado.
No vício, imperam as emoções. O viciado é incapaz de ouvir a voz da razão. O fumante sabe que fumar causa câncer, envelhece precocemente, deixa os homens impotentes e envenena o leite materno. Mas nem por isso deixa de baforar seu cigarrinho a cada 30 ou 40 minutos. Se você, que não é viciado em nicotina, está por perto, azar o seu. Você é transformado em fumante passivo, que, afirmam os cientistas, é pior que fumar o próprio cigarro. O fumante passivo acaba aspirando a fumaça que o fumante ativo tragou e expeliu. Mas fumar é um charme e... charme coisa nenhuma: é vício. Uma armadilha em que pessoas caem e quando conseguem livrar-se é a duras penas.
Fazendo parte das chamadas preferências nacionais, tanto o cigarro quanto as bebidas alcoólicas sustentam indústrias de peso, que empregam grande número de trabalhadores regulares. Além disso, contribuem com altos impostos ao governo. A maconha, a cocaína e o crack, sendo ilícitos, além de não pagarem impostos, locupletam-se de mão-de-obra clandestina, fora da lei. Mas fazem parte de uma indústria organizada que, por trás de faces miseráveis, alimenta intocáveis barões multimilionários e sem rosto.
Por outro lado, estamos todos, de uma ou de outra forma, drogados. Envolvida em problemas de saúde, uma pessoa pode ver-se na contingência de ter que engolir um número considerável de comprimidos ao dia. Tenho certeza de que os médicos prescrevem-nos com a melhor das intenções. Mas há sempre efeitos colaterais, às vezes, devastadores. Não é de graça que temos drogarias espalhadas por quase todos os quarteirões de nossas cidades. A indústria farmacêutica parece ser um negócio hiperlucrativo. Se estamos doentes e praticamente mergulhados em drogas, nossos adolescentes dificilmente tomarão rumo diferente.
O experiente psiquiatra não tapou o sol com a peneira. Mas certamente sabe que sua afirmação não ecoará. Drogas são drogas. Mas, ao classificá-las em lícitas e ilícitas, os homens criaram um problema praticamente insolúvel para toda a sociedade. É claro que o ser humano sempre precisou de uma válvula de escape. Na dose certa é remédio, dizem uns. Mas como domar a fera oculta num copo, por exemplo? Uma dose chama outra e outra e mais outra. Uma substância inserida em bebidas que crianças e pré-adolescentes crescem ouvindo seus pais chamarem carinhosamente de “a minha cervejinha”, “o meu vinhozinho” e “o meu uisquinho”, dificilmente, num futuro breve, será evitada por eles. Difícil, muito difícil.
Hermes Aquino* O crack é devastador, mas o álcool é o craque das drogas. Sucesso em vendas, muitas vezes é o causador de tragédias do nosso cotidiano. Está infiltrado em quase todas as manifestações de “alegria e descontração” do ser humano. É extensa a nomenclatura de bebidas que, anunciadas charmosamente, no fundo não passam de álcool, misturado a outras substâncias, variando apenas seu teor. Como desejar que um adolescente, em plena “festa da vida”, não se drogue com álcool? Difícil, muito difícil.
A dependência ao álcool é fartamente comprovada. Sua aquisição só não causa maiores reações em seus usuários porque a droga é vendida, praticamente sem controle, em qualquer estabelecimento comercial do ramo. Se fosse proibida, como outras drogas, certamente o alcoolista cometeria qualquer desatino para alcançá-la. Vício é assim. Se você tem um fumante ativo em casa (ou no trabalho), sabe do que estou falando. É quase impossível convencê-lo a não fumar após ingerir algum alimento ou diante de um desafio qualquer. Vício é doença. Tem que ser tratado.
No vício, imperam as emoções. O viciado é incapaz de ouvir a voz da razão. O fumante sabe que fumar causa câncer, envelhece precocemente, deixa os homens impotentes e envenena o leite materno. Mas nem por isso deixa de baforar seu cigarrinho a cada 30 ou 40 minutos. Se você, que não é viciado em nicotina, está por perto, azar o seu. Você é transformado em fumante passivo, que, afirmam os cientistas, é pior que fumar o próprio cigarro. O fumante passivo acaba aspirando a fumaça que o fumante ativo tragou e expeliu. Mas fumar é um charme e... charme coisa nenhuma: é vício. Uma armadilha em que pessoas caem e quando conseguem livrar-se é a duras penas.
Fazendo parte das chamadas preferências nacionais, tanto o cigarro quanto as bebidas alcoólicas sustentam indústrias de peso, que empregam grande número de trabalhadores regulares. Além disso, contribuem com altos impostos ao governo. A maconha, a cocaína e o crack, sendo ilícitos, além de não pagarem impostos, locupletam-se de mão-de-obra clandestina, fora da lei. Mas fazem parte de uma indústria organizada que, por trás de faces miseráveis, alimenta intocáveis barões multimilionários e sem rosto.
Por outro lado, estamos todos, de uma ou de outra forma, drogados. Envolvida em problemas de saúde, uma pessoa pode ver-se na contingência de ter que engolir um número considerável de comprimidos ao dia. Tenho certeza de que os médicos prescrevem-nos com a melhor das intenções. Mas há sempre efeitos colaterais, às vezes, devastadores. Não é de graça que temos drogarias espalhadas por quase todos os quarteirões de nossas cidades. A indústria farmacêutica parece ser um negócio hiperlucrativo. Se estamos doentes e praticamente mergulhados em drogas, nossos adolescentes dificilmente tomarão rumo diferente.
O experiente psiquiatra não tapou o sol com a peneira. Mas certamente sabe que sua afirmação não ecoará. Drogas são drogas. Mas, ao classificá-las em lícitas e ilícitas, os homens criaram um problema praticamente insolúvel para toda a sociedade. É claro que o ser humano sempre precisou de uma válvula de escape. Na dose certa é remédio, dizem uns. Mas como domar a fera oculta num copo, por exemplo? Uma dose chama outra e outra e mais outra. Uma substância inserida em bebidas que crianças e pré-adolescentes crescem ouvindo seus pais chamarem carinhosamente de “a minha cervejinha”, “o meu vinhozinho” e “o meu uisquinho”, dificilmente, num futuro breve, será evitada por eles. Difícil, muito difícil.
18 de abril de 2009 | N° 15943
Zero Hora
*Músico e publicitário
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